sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Sede

Dormitava sossegada debaixo de uma pedra. O sol me aquecia e eu estava tão profundamente mergulhada no sono que não vi quando o escravo jogou sobre mim um cesto, onde fiquei presa. Cobriram-me com um pano e me levaram para longe. Fui ficando irritada, impaciente e com fome. Apesar de tudo, cochilei. Quando acordei estava escuro ao meu redor, e pela trama do tecido que cobria o cesto não passava mais nenhuma luz. Devia ser noite. O cheiro de essências e perfumes era forte. Pessoas cruzavam o aposento, que devia ser grande, pois eu ouvia o eco de suas vozes nas paredes. Havia agitação e ansiedade no ar. Eu estava morta de fome, e comecei a me agitar, e a silvar. Minha língua estava seca. De repente, tudo ficou calmo. Alguém pegou o cesto, tirou o pano de cima, e eu vi, pelas frestas da palha, a luz das tochas a tremeluzir nas pinturas das altas paredes. Pensei comigo mesma como eu gostava do lápis-lazúli, diferente do ocre que sempre me cercava. Então, uma mão fina e de longas unhas negras penetrou no cesto e me tomou, delicadamente. A mulher bateu levemente as pestanas e me aninhou entre os seios. Senti o calor, o latejar da artéria e, inebriada com o perfume daquela pele doce, cravei ali as presas e misturei minha saliva com o sangue da rainha.